Por estes dias, alguns dos mais entusiasmantes projectos independentes portugueses andam à volta do vinho de talha alentejano.
Uma herança milenar, deixada pelos romanos há 2000 anos e perpetuada em terras alentejanas por aqueles que foram mantendo viva a tradição dos seus antepassados. Esta técnica de vinificação, de grande riqueza histórica, tem vindo a ser recuperada nos últimos anos por cada vez mais adegas e produtores que têm apostado neste estilo. O vinho de talha está na moda.
Apesar de hoje se produzir vinho em ânforas e talhas de barro em praticamente todo o país, fruto das novas tendências de vinificação, o Alentejo é historicamente a região portuguesa da produção deste estilo de vinho. Dentro das suas fronteiras existem várias localidades com uma grande tradição na elaboração do vinho de talha, sendo o concelho da Vidigueira o seu epicentro e Vila de Frades a sua capital. Mas existem outras vilas e aldeias menos divulgadas que também têm a herança dos vinhos de talha, como é o caso da Amareleja, no concelho de Moura, de onde nos chega o projecto de que hoje falo.
Provavelmente o nome “Produções Anónimas” ainda não nos diz muito, mas é deste projecto que nascem os vinhos de talha Maquete Barro, produzidos por dois amigos enólogos na Amareleja. Um projecto pessoal que explora uma enologia de autor, enquanto se dá a conhecer o melhor da tradição e autenticidade alentejana do vinho de talha. Para isso arregaçaram as mangas e começaram a trabalhar duas vinhas, uma na Amareleja e outra em Montemor-o-Novo, ambas em modo de produção biológica. A vinificação é feita numa adega artesanal da Amareleja, onde se encontram as talhas antigas que usam.
O Maquete Branco 2021, é feito a partir de uma mistura de castas da vinha da Amareleja (o chamado field blend), onde podemos encontrar Diagalves, Manteúdo, Antão Vaz, Rabo de Ovelha e Roupeiro. As uvas fermentaram espontaneamente durante 15 dias em duas talhas antigas, tendo estas sido depois “abertas” em dezembro. O estágio foi feito em tarecos (pequenos potes de barro) até ao engarrafamento. O vinho foi vinificado de forma natural e sem qualquer processo de estabilização. Mostra-se de cor viva, própria da curtimenta, com um aroma sério, de fruta branca madura e sensações vegetais, num registo muito puro e contido. Boa presença de boca, num tom muito fresco, fruto da excelente acidez, com a presença da fruta em bom diálogo com as habituais notas de barro, resina e ligeira oxidação características destes vinhos. É uma excelente estreia para o projecto, este branco de talha.
Já o Maquete Tinto 2021 é proveniente da vinha de Montemor e é composto pelas castas Moreto, Alicante Bouschet e Touriga Nacional. Foi vinificado precisamente da mesma forma que o branco, com a diferença que aqui o estágio foi feito em inox até ao engarrafamento. Apresenta-se aberto na cor, fruto de uma extracção comedida, focado e limpo de aromas, com sugestões de fruta vermelha, barro, notas terrosas e vegetais. De tanino fino, ataque seco e acidez bem proporcionada, é polido e elegante, com um leve travo de talha, terminando com um final muito saboroso e de média persistência.
Com imenso carácter, mas muito puros e limpos, são vinhos que dão imenso prazer a beber. Melhor estreia não se podia pedir para as Produções Anónimas e para os seus Maquete. Gostei muito, principalmente do branco. Com pvp de 18€, podem ser encontrados em garrafeiras especializadas.