Louis Daguerre ficou conhecido por ser um dos pais da fotografia e a sua invenção, o daguerreótipo, nas primeiras décadas do século XIX veio revolucionar o mundo com algumas das primeiras imagens fotográficas conhecidas. A sua descoberta teve uma importância tão grande à escala global que lhe valeu honras de ter o seu nome a baptizar uma rua da cidade de Paris. A Rue Daguerre, no 14º Bairro (a sul de Montparnase, próximo das Catacumbas de Paris), historicamente um lugar de comerciantes e artistas, é hoje uma das mais animadas e populares da cidade. Por entre variadas individualidades e artistas que se fixaram nesta zona da cidade, Agnés Varda, a famosa cineasta belga de origem francesa, foi uma das mais importantes. Tornou-se um verdadeiro símbolo da Rue Daguerre, assumindo a paixão que tinha por aqui viver e chegando mesmo a filmar num documentário as gentes e os hábitos que encontrava no seu dia a dia. A sua importância para o bairro era tanta que, quando faleceu em Março de 2019, muitos moradores defenderam que a rua passasse a ter o seu nome.
Mas não é só este lado cultural e boémio que nos leva à Rue Daguerre cada vez que visitamos Paris. É que esta artéria além de nos mostrar a vida das ruas do 14º bairro, é também um verdadeiro mercado a céu aberto, com os seus comerciantes de fruta, legumes, flores, carne, peixe e vinho, a colorirem e perfumarem o ambiente. É encantador ver o frenesim num sábado de manhã, quando a rua se enche para as compras do fim de semana ou simplesmente para um café numa esplanada, enquanto se sente o pulsar desta zona da cidade. A melhor forma de chegar é através da estação de metro de Denfert-Rochereau, na praça com o mesmo nome, onde podemos ver a réplica em bronze do Leão de Bartholdi, símbolo da resistência francesa em homenagem ao coronel Denfert-Rochereau. Depois é descer poucos metros pela Avenue du Général Leclerc e virar na primeira à direita para a Rue Daguerre. Convém ter em conta que todas estas artérias adjacentes, não tendo o charme da Rua Daguerre, também merecem visita.
Centremo-nos então no paraíso gastronómico que é actualmente a Rue Daguerre. Começando pelo lado da Avenida du Général-Leclerc, onde a rua é mais animada, assistimos a um verdadeiro desfile de tentações, porta sim, porta sim. Só restaurantes e cafés são dezenas, para todos os gostos e todas as bolsas. Destaque para o clássico Café Daguerre, a elegante Maison Péret, uma brasserie clássica, com o charme das brasseries parisienses e, a pornográfica Daguerre Marée, que além de servir refeições também vende peixes e mariscos frescos. Se quisermos fugir ao tradicional, ou optar por uma refeição mais rápida, temos opções de cozinha chinesa, japonesa, vietnamita, africana, ou indiana, tudo sem sair da mesma rua. Passando às mercearias e charcutarias, podemos começar pelos queijos e ficar de água na boca com a banca da Fromagerie Vacroux e da Fromagerie Androuet, a primeira num registo mais popular, com os queijos expostos numa banca de rua e a segunda com um visual mais sofisticado. Nas mercearias, entre muitas opções, destacam-se as frutas e os legumes da Au Bon Jardinier, que enchem a rua de cor e, directamente do produtor, os produtos biológicos da Au Bout du Champ. Para os carnívoros, visitas obrigatórias à Boucherie Daguerre e, aqui vale a pena desviar pela transversal Rue Boulard, para o talho de Hugo Desnoyer, fornecedor da residência oficial do presidente da república e de alguns dos mais reputados restaurantes da cidade. Já agora, para a desgraça ser completa, damos um saltinho ao foie gras da Valette.
Para os gulosos as tentações também são muitas, começando pela decadência das montras da La Meringaie, uma cadeia de pastelarias em que as pavlovas são famosas, seguindo pelos chocolates de Alain Ducasse e, só para dar mais um exemplo, a pastelaria fina da Maison Thevenin. E para terminar este desfile de pecado, o vinho, figura maior da produção francesa, também não poderia faltar. As opções voltam a ser variadas, haja carteira, mas o destaque fica para a La Cave des Papilles, a garrafeira que é o paraíso para os apreciadores de vinhos naturais. A oferta é alargada, muita de pequenos produtores que nunca ouvimos falar, mas é também esse espírito de descoberta que torna obrigatória uma visita a esta loja. Além disso podemos ter a sorte de nos cruzarmos com algumas das jóias raríssimas que por vezes surgem nas partaleieras da Papilles, como o Les Noëls de Montbenault de Richard Leroy, por exemplo.
Apesar da oferta gastronómica ser um dos principais pontos de interesse da Rue Daguerre, existem outras motivações, dos mais variadas áreas, que levam diariamente milhares de pessoas a esta artéria parisiense. Dos livros à fotografia, do cinema aos discos de vinil, de escolas de música e dança a outras atracções culturais, são muitos os motivos para não perdermos uma ida à Daguerre aquando de uma visita a Paris.