Para os apaixonados do vinho, ou simplesmente para quem gosta de viajar, Bordéus é um excelente destino a partir de Portugal. A viagem é curta, os vôos são baratos e tanto as estadias como a restauração são a preços bastantes razoáveis, mesmo para uns pobretanas tugas como nós. Sobre os atributos da cidade já falei aqui e apesar da Cité du Vin já ser uma realidade, o texto continua bastante actual.
Aproveitando um fim de semana prolongado em Fevereiro de 2019, já com a pandemia a pairar sobre as nossas vidas, voltei a uma cidade que gostei muito de visitar e que voltarei com prazer sempre que for possível. Ao contrário da ida de 2015, com amigos do vinho e focada nesse ponto de interesse, esta foi uma viagem a dois e por isso houve que negociar que um passeio ao Médoc ou a Saint Emilion também pode ser romântico (cof cof). Com a agenda definida, uma das manhãs foi reservada para visitar a região do Médoc, na margem esquerda de Bordéus e o produtor escolhido foi o Château Gruaud-Larose, na apelação de Saint-Julien, por sugestão de um amigo que passou por lá durante o seu percurso profissional.
Gruaud-Larose é uma casa histórica de Bordéus e muito particularmente da apelação de Saint-Julien. É um 2ème Grand Cru Classé, um título atribuido pela Classificação de 1855, criada a pedido de Napoleão III por ocasião da Exposição Universal de Paris, para classificar os melhores vinhos da margem esquerda de Bordéus, do Medoc a Graves, incluindo os vinhos doces de Sauternes e Barsac. Mais de um século e meio depois esta classificação continua válida e até aos dias de hoje só se alterou uma vez, para elevar o Chateau Mouton Rothschild ao estatuto de 1er Grand Cru Classé.
Ao longo da sua história, Gruaud-Larose teve vários proprietários e as suas fronteiras foram mudando ligeiramente. Com alguns altos e baixos, teve na década de 90 do século passado o pior momento da sua história, com uma gestão menos rigorosa que originou uma desvalorização na cotação dos seus vinhos, tendência que se alterou radicalmente, quando na década seguinte foi adquirido pela família Merlaut, que com a liderança de Jean Merlaut voltou a ter os seus vinhos no grupo dos mais valorizados 2ème Grand Cru de Bordéus. Um status que estes vinhos sempre tiveram, pois Gruaud-Larose, pela localização e qualidade dos seus solos, é considerado como um dos melhores terroirs para a Cabernet Sauvignon de todo o Médoc.
Com a entrada de Jean Merlaut houve uma grande aposta nas práticas sustentáveis e Gruaud-Larose foi mesmo o primeiro château de Bordéus a abolir o uso de pesticidas e herbicidas, apostando numa viticultura biológica e uma vinificação de menor intervenção, sem que isso possa colocar em causa o perfil dos seus vinhos. Actualmente a propriedade detém cerca de 80 hectares de vinha, com a Cabernet Sauvignon a ser a variedade mais plantada e o responsável pela enologia é o famoso Eric Boissenot, considerado por muitos a autoridade máxima na enologia do Médoc.
À boa maneira de Bordéus, este produtor apenas tem dois vinhos. A grande referência da casa, o Chateau Gruaud-Larose, que habitualmente é um lote de 60% de Cabernet Sauvignon, 30% de Merlot e uma pequena percentagem de Cabernet Franc e Petit Verdot. E o segundo vinho, Sarget de Gruaud-Larose, que habitualmente leva 50% de Cabernet Sauvignon e 40% de Merlot, também temperado pelas Cabernet Franc e Petit Verdot. Para muitos, Saint-Julien é a apelação que origina os vinhos mais elegantes do Médoc e os Gruaud-Larose conseguem de facto uma excelente harmonia entre a riqueza e a presença da fruta, com uma frescura e elegância que acabam por ser decisivas para caracterizar o perfil destes vinhos. São também reconhecidos pela excelente capacidade de guarda, com muitos dos seus vinhos a durarem muitas décadas.
A visita descrita custou 20€ e contempla uma visita guiada pela propriedade, enquanto nos vão contando a sua história e uma curta prova de vinhos. A visita começa com a subida ao topo da famosa torre de metal – um dos ex libris do château – de onde se pode cotemplar vistas únicas da região do Médoc, prosseguindo depois pela adega e sala de barricas, terminando na loja do château, rodeados de merchandising, para provar as duas referências produzidas na propriedade. Existe outra visita, creio por 40€, onde é possível provar mais colheitas. Em jeito de balanço, foi uma excelente experiência, ter a oportunidade de ficar a conhecer o sentido do lema da casa, “Le Vin des Rois, le Roi des Vins” e melhor entender a história de uma das grandes referências do Médoc, que também é um dos mais consagrados Château 2éme Grand Cru de Bordéus.
Nota: Assim que o tempo e a inspiração o permitir, conto actualizar o Comer em Bordéus com as novas entradas desta última viagem.