Aphros Melissae 2018

Admiro imenso o Vasco Croft. Muito pelos vinhos que cria, mas essencialmente pela postura que mantém num sector e numa sociedade cada vez mais desorientada. E estou perfeitamente à vontade para dizer isto, porque não o conheço pessoalmente, nunca falei sequer com ele, não sendo por isso esta uma opinião construída a partir de uma simpatia pessoal ou qualquer outra empatia.

Para quem não sabe, Vasco Croft, assim que assumiu os destinos da Quinta do Casal do Paço em Arcos de Valdevez, foi um dos precurssores da biodinâmica em Portugal, ainda a cena dos vinhos naturais eram uma miragem no nosso país. Fê-lo sempre com personalidade, com conhecimento, com seriedade, sem pinga de extremismos, antes acreditando numa filosofia e lutando por implementá-la. Nunca necessitou de agitar bandeiras nas redes sociais que os seus vinhos eram melhores que outros porque eram feitos desta ou daquela maneira. Com naturalidade e mérito construiu o percurso dos vinhos Aphros e hoje é uma referência da biodinâmica no nosso país, mas também no estrangeiro. Apesar do sucesso a postura continua a mesma, sóbrio, discreto, inteligente, longe dos fúteis holofotes da fama.

Desde que conheço os vinhos Aphros já provei e bebi muitas coisas. Umas gostei muito, outras nem por isso, mas achei sempre vinhos fiéis ao que o produtor quis deles. Foi por exemplo com um Aphros Vinhão que abri os horizontes para as potencialidades da casta, após a considerada crítica Jancis Robinson o ter incluído numa lista dos seus vinhos favoritos de então. Agora, a razão principal para esta publicação, foi a novidade Melissae, apresentada no início deste malfadado ano de 2020.

Como pode ler-se na nota de apresentação publicada pela Aphros, esta é uma geração de vinhos que entra numa nova fase do projecto, sendo os primeiros com a assinatura de Tiago Sampaio e Miguel Viseu na enologia. O Aphros Melissae 2018 é um monocasta de Loureiro, de vinhas do ponto mais alto da Quinta do Espadanal, onde se encontram as colmeias existentes na propriedade. Daí o nome do vinho, Melissae, como a ninfa que descobriu o uso do mel. Depois do contacto pelicular em inox, o vinho teve estágio em ovos de cimento antes de ser engarrafado. É um branco muito delicado, que após ligeira redução inicial que desapareceu de imediato com o arejamento, revela suaves notas florais e de citrinos. O corpo é muito fino, leve, mas com muita personalidade, num estilo muito próprio e original, com uma excelente acidez e um final de boca fino e fresco. Pareceu-me ainda muito jovem e com bom potencial de evolução em garrafa. Não é um vinho fácil, de compreensão imediata, é um vinho que pede para ser consumido com tranquilidade e tempo. Foram produzidas menos de 3000 garrafas e o preço do vinho ronda os 25€.

NOTA : A Revista de Vinhos atribuiu 19 valores a este vinho e, sem querer por em causa a opinião e o gosto de quem o provou e pontuou, depois de o beber fiquei com uma sensação de desilusão. É que 19 pontos só estão ao alcance dos grandes brancos do mundo e, sem desprimor para este Aphros, não é o caso. Impunha-se, digo eu do alto da minha ignorância enquanto consumidor, que as publicações viessem informar, a bem da sua própria credibilidade, que critérios usam actualmente na avaliação dos vinhos. Fico curioso em saber por exemplo, para avaliar um grande Porto Vintage, ou um grande Madeira, ou um grande Chablis, ou outro qualquer grande vinho do mundo, que escala usarão, será que estica até aos 25?

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