Este foi o primeiro vinho que abri em 2015. Depois da animação da noite de 31, passada entre amigos, claro está, o dia 1 foi muito tranquilo. Acordar tarde, sair da cama para o sofá, ver televisão e arranjar coragem para preparar qualquer coisa para comer. Depois do pequeno almoço (que tomou a vez do almoço) e quando o sol já ameaçava pôr-se, chegava a hora de almoçar.
O que me estava mesmo a apetecer era uma sopa reconfortante e lembrei-me de uma receita que costumo fazer, a sopa de marisco tailandesa (Tom Yum Talay). Num rasgo de coragem dirigi-me à Rua da Palma, apetrechei-me de cogumelos, camarões, gengibre, malaguetas frescas, couve chinesa (bok choy) e voltei a correr para preparar o almoço (ou seria jantar?). O resto dos ingredientes tinha em casa, de preparações anteriores.
Enquanto inventava um caldo de galinha com Caldos Knorr Natura, que iria servir de base para a sopa, abri o vinho que tinha deixado a refrescar (na varanda, que estava um frio de rachar) e que tinha sido o escolhido para a primeira aparição do ano, o Pai Abel Branco 2012.
Um branco da Bairrada que se veio a revelar extraordinário. Feito a partir das castas Bical e Maria Gomes, estagiado em barricas usadas da Borgonha, resulta, na minha opinião, no melhor Pai Abel Branco que o produtor Mário Sérgio Nuno já deu ao mundo. Encantador em todos os sentidos. Na complexidade que casa a gulodice da fruta madura com a austeridade de um fundo seco e mineral, por entre a estrutura sólida de um Hércules e a delicadeza requintada de uma Afrodite, num conjunto fresco e intenso, de final longo e persistente, que o coloca no Olimpo dos brancos portugueses. Pode ser encontrado em garrafeiras especializadas e por pouco mais de 20€ podemos ter acesso a um dos melhores brancos produzidos em Portugal. É recomendável deixarem uma (pelo menos) garrafinha perdida no fundo do baú, pois a longevidade destes vinhos é reconhecida. Não se atrasem que a produção é muito limitada (18).
Enquanto me ia lambendo com um copo do dito os aromas da Tom Yum Talay invadiam a cozinha, a sopa estava a apurar, faltava agora finalizar com um ramo de coentros picados. De seguida, com a mesma ainda a escaldar, servi-me de uma avantajada tigela e fui sorvendo (e isto faz toda a diferença) o caldo para depois me deliciar com o lado sólido que sobra no fundo da mesma. O resultado, além de delicioso, é energético e reconfortante.
A escolha do vinho não foi de forma alguma pensada a harmonizar com a receita, mas a verdade é que a complexidade do Pai Abel lidou lindamente com o lado salgado, ácido e picante, deste prato, proporcionando um momento de grande empatia à mesa (ou seria da fome?).
Deixo para os interessados a base da receita que costumo seguir, sendo que a fui adaptando a gosto (o bok choi e os cogumelos frescos passaram a obrigatórios por ex). Façam o favor de ter em conta que com um caldo de galinha caseiro e marisco fresco a receita ganha outra dimensão.
Aviso: A preparação desta receita sem a companhia de um copo de Pai Abel Branco 2012 vai, incontornavelmente, ter influencia no resultado final da mesma 🙂