A pandemia virou-nos a vida ao contrário. Além das restrições à nossa vida normal, tanto profissionais como pessoais, esta crise pandémica também veio mexer com os nossos principais hábitos e rotinas. Duas dessas rotinas que mais rapidamente tivemos de nos adaptar foi a optimização dos alimentos que temos em casa e das ida às compras. Se a primeira era uma preocupação que já tinhamos, não tão rigorosa como agora obviamente, a segunda teve de ser uma mudança mais radical, até pelos riscos que comporta. Vivo em Lisboa e no bairro onde habitamos existe muito comércio local e uma oferta muito alargada de todos os produtos alimentares. Este comércio local é muito activo, com mercearias, talhos, padarias, peixarias, vários espaços de restauração que vendem para fora, etc. A complementar esta oferta, só no raio de 1 km temos 5 supermercados de proximidade, 3 Minipreços e 2 My Auchan, pelo que é fácil perceber que ir às compras nunca foi uma actividade que necessitasse de grande planeamento. Além disto, uma vez por mês, o grosso das compras era feito num hipermercado.
Foi esta comodidade que deixámos de ter de um dia para o outro e um novo paradigma a que rapidamente nos tivemos de adaptar. A forma como nos organizámos passou por três regras básicas. Primeiro, comprar uma quantidade maior de alimentos de cada vez, porque além do recolhimento também iamos passar a fazer todas as refeições em casa. Segundo, comprar alimentos passíveis de serem consumidos durante um período mais alargado de tempo, congelados ou não. E terceiro, tentar fazer uma alimentação o mais saudável possível, sem entrar em fundamentalismos parvos, antes tendo a preocupação de diversificar ao máximo o tipo de alimentos consumidos. Definida a estratégia era então hora de ir às compras.
Se numa fase inicial fomos ingénuos o suficiente ao ponto de pensarmos que podíamos continuar a fazer as nossas compras nos mesmos locais, dentro da rotina mais ou menos habitual, depois de uma primeira ida ao hipermercado (na fase aguda do sindroma do papel higiénico) rapidamente percebemos que a solução teria de passar por um comércio mais próximo e tradicional. Esta decisão foi fácil de tomar quando essa visita ao hipermercado deixou evidentes os riscos e as dificuldades de agora fazer compras numa grande superfície, muita gente, filas de espera e escassez de alimentos, pelo menos aqueles mais básicos (tudo o que era mais caro continuava disponível sem quebras).
Com as lojas online das grandes cadeias entupidas, com prazos previstos de entrega superiores a duas e três semanas, pareceu-nos óbvio que a solução passava por aqueles lugares mais próximos onde recorriamos apenas pontualmente. A fruta e os legumes passámos a comprar numa mercearia próxima que todos os dias tem produtos frescos. Ligamos na véspera, fazemos a nossa encomenda e no dia já temos os sacos preparados, é só passar e apanhar. O pagamento é feito em dinheiro, o que não é o ideal nesta fase, mas tentamos levar a quantia certa para evitar trocos. Se não for possível e tivermos mesmo de receber troco, levamos um saco plastico pequeno (daqueles usados para os liquidos nos aviões) e pedimos ao Sr para lá colocar o troco dentro.
A carne vem do mercado de Arroios, de um talho que não sei o nome mas que os meus sogros são clientes há muitos anos. Também entregam em casa. Neste caso juntamos a nossa encomenda à dos meus sogros e depois vamos lá apanhar. Sempre a respeitar as distâncias de segurança, nós no patamar de baixo e eles deixam o saco à porta.
O peixe fresco vem do mercado 31 de Janeiro, que através do Peixe à Porta entregam em toda a Lisboa. É um excelente serviço. Encomendamos na véspera e entregam no dia de manhã cedo. O peixe é muito fresco, vem bem amanhado e a entrega é feita pelos próprios. Primeiro entregam e só depois pagamos, através do nib que vem na factura. Os preços estão no site mas podem diferir um pouco, depende da oscilação dos preços nos fornecedores.
O pão, até há uns dias atrás, continuavamos a comprar no mesmo local e sem alterar rotinas. Mas a Massa Mãe decidiu fechar uns dias, segundo os próprios para avaliar as condições de segurança para si e para os seus clientes. Até ao momento ainda não necessitámos de pão (é um alimento que só consumimos ao pequeno almoço e só uma fatia) mas a alterantiva mais óbvia será recorrer a uma das várias padarias do bairro. Antes disso ainda vamos usar, finalmente, o Brodmix do Ikea que está na despensa há meses.
Tudo o resto, produtos de higiéne, limpeza, enlatados, etc, temos recorrido a um My Auchan próximo de casa. A loja é pequena mas está bem organizada, tem praticamente tudo o que um grande supermercado tem mas em pequena escala. Dependendo dos horários há momentos que não tem muitas filas e as entradas são bem controladas para nunca haver muitas pessoas ao mesmo tempo dentro da loja. Até ao momento tem sido uma boa opção.
Para o fim deixei um dos bens mais importantes da nossa alimentação, principalmente para um enófilo, o vinho. Podem levar a afirmação para o lado da piada, mas se bebido com moderação o vinho pode mesmo ser um bom alimento. Após o impacto inicial e respectivos lamentos, rapidamente o sector do vinho, das garrafeiras aos produtores, se adaptaram e contruiram os seus canais de vendas online. Do lado das garrafeiras, as poucas que ainda não tinham esses canais a funcionar depressa os adoptaram, enquanto que as outras intensificaram a sua actividade. Já nos produtores, aí a coisa foi (ainda está a ser) um pouco diferente. Alguns, poucos, que já tinham uma loja online a funcionar usaram esse canal para promover e dentro do possível intensificar as vendas dos seus vinhos mas, a grande maioria, decidiu criar um canal de vendas online próprio. Outros ainda, na minha opnião a decisão mais acertada, em alternativa optaram por aderir a um dos vários Marketplace que passaram a estar disponíveis, como por exemplo este do Adegga, ou este do Enóphilo. Além de terem poupado nos custos da implementação dos ditas lojas, ainda criaram o valor de estar presentes num local onde o consumidor pode diversificar as suas compras por vários produtores.
Decidi testar a resposta destes canais e até ao momento, nestas três semanas de quarentena, experimentei 5 lojas online, quatro de garrafeiras e uma de produtor. A técnica para as entregas, salvaguardando a segurança de todos, é sempre a mesma, deixam no elevador e apanhamos no andar. Nas garrafeiras, a Wines 9297 e a The Wine Company, foram as que deram as respostas mais rápidas. A Wines entregou mesmo no próprio dia e a Wine Company de um dia para o outro. A encomenda da Wine Company, além de vinho, também trouxe chamuças e kachori do Chez Saroj, dos mesmos proprietários. De salientar que em ambas as situações as entregas foram feitas pelos próprios, o que demonstra que sempre que não é necessário recorrer a empresas de logística o processo é menos demorado. De seguida a Cave Lusa, de Viseu, que via empresa de logística demorou apenas dois dias úteis a entregar, também um excelente serviço. A única que teve uma avaliação menos favorável foi a Garrafeira Nacional, tanto na comunicação com o cliente como na demora da entrega. Ao finalizar a encomenda recebi um email de confirmação com a mensagem, “Assim que a encomenda sair para expedição receberá um email com a respectiva informação de envio”. Depois deste email só tive notícias da GN duas semanas depois quando tocaram à porta para fazer a entrega. Por fim, o produtor escolhido como cobaia para este teste foi o Hugo Mendes, que há muito tempo explora estes canais online. A entrega ainda não aconteceu mas a encomenda também ainda só foi feita há três dias úteis. No entanto, ontem, recebi um email do Hugo a justificar um problema técnico que poderá atrasar um pouco a entrega e o respectivo pedido de desculpas. Não custa nada e penso que é fundamental este acompanhamento ao cliente, principalmente quando as coisas não correm bem. No futuro conto testar outros canais e também partilhar aqui como correram as experiências, nessa altura actualizarei o resultado da encomenda do Hugo Mendes.
E pronto, assim se alteraram hábitos e se passaram a fazer as compras de bens essenciais nos dias de hoje, procurando alternativas e chegando à conclusão que muitas delas se encontravam à nossa porta. Em jeito de conclusão, parece uma certeza que depois desta crise os canais online irão ganhar mercado, mas o comércio local, com uma oferta mais próxima e sustentável entre o produtor e o consumidor, também o fará. Espero que tenham gostado da publicação, que mais do que relatar a nossa experiência pessoal teve a intenção de deixar algumas dicas que possam ser úteis. Cuidem-se e até breve.